Publicado originalmente no Brownstone Institute


Vamos relembrar um pouco da história. O Brasil foi o último país de todo o ocidente a abolir a escravidão. Isso ocorreu em 1888, com a Lei Áurea. Na sociedade brasileira da época, enquanto alguns lutavam contra a escravidão, outros queriam conservá-la. A abolição veio apenas quando a maioria se tornou contra. Durante boa parte da luta abolicionista, quem era a favor de libertar os escravos tinha um argumento forte: o Brasil era o único país do ocidente a ter a escravidão. O último.

Para comparação, a abolição da escravidão ocorreu no Chile em 1823, no México em 1824, na Argentina em 1853 e nos EUA em 1865. Ou seja, os abolicionistas brasileiros falaram do exemplo dos EUA por mais de 20 anos até conseguirem o que queriam.

Quando falamos em liberdades individuais, é difícil um país aberto e livre, de cultura razoavelmente semelhante a outros países próximos, devido à intensa troca cultural, comercial e turística, evoluir sozinho. Há a influência do que outras sociedades estão fazendo. Isso é assim em todos os aspectos das liberdades individuais.

Outro exemplo é o direito ao casamento de pessoas do mesmo sexo. O reconhecimento inicial veio da Bélgica, em 2003. Dois anos depois, Canadá e Espanha já reconheciam esse direito. No Brasil, França e Uruguai, o reconhecimento foi em 2013. Nos EUA foi em 2015, e assim seguiu em todo o ocidente, um país atrás do outro.

Enquanto essa evolução nas liberdades individuais e direitos dos homossexuais ocorria no ocidente, o Estado Islâmico matava gays jogando-os de edifícios. Matar homossexuais apenas por serem homossexuais é muito além de não reconhecer união de pessoas do mesmo sexo, o passo anterior que o ocidente estava.

Imagem de um vídeo do EI no qual dois membros atiram um homossexual do alto de um edifício. Esta execução ocorreu no Iraque. Foto reprodução.

A questão, no caso do Estado Islâmico, é que a maioria da sociedade local apoiava matar homossexuais de modo entusiasmado. Houve um caso em que um homem, depois de atirado de uma torre e bater no chão, ainda estava vivo. Ele foi morto a pedradas por uma multidão que assistia a execução. Essa prática era comum e recebida com aplausos pelas multidões presentes.

Multidões comemoram homossexuais sendo jogados dos prédios. Se não morriam na queda, eles mesmos matavam com pedradas. Foto reprodução.

2024 e as vacinas COVID-19 no Brasil

O Brasil é o único país do mundo obrigando vacinas COVID-19 em crianças de 6 meses a 5 anos de idade. Nenhum outro país de todo o planeta faz isso. Nem o Iraque, Afeganistão, Líbia ou Síria.

Vou repetir o fato para que fique claro: estamos em 2024 e o Brasil é o único país do mundo obrigando vacinas COVID-19 em bebês de 6 meses de idade até 5 anos. O único.

Vou mais longe: enquanto o Brasil obriga, Reino Unido, Alemanha, Suécia, Dinamarca, e Suíça, apenas para citar exemplos de alguns países importantes e conhecidos por terem respeito à suas populações, sequer recomendam para crianças. 

Nestes cinco países usados no exemplo, as vacinações COVID-19 ocorrem apenas em exceções: apenas para as crianças muito doentes, após passarem por uma avaliação médica rigorosa e terem uma receita médica recomendando. E mesmo assim, nestes casos específicos, os governos não obrigam.

O motivo desses países sequer recomendarem? O risco supera o benefício. Simples assim. Alguns desses países, no início, chegaram a recomendar – não obrigar – para jovens. Um exemplo é a Dinamarca, mas no meio de 2022, o ministro da saúde do país, Soren Brostrom, foi a público pedir desculpas por ter um dia recomendado. “As vacinas não foram predominantemente recomendadas para o bem da criança”, afirmou.

Um estudo marcante, que fez com que ninguém obrigasse e a maioria dos países sequer recomendassem, foi o feito pela equipe de Vinay Prasad, epidemiologista famoso da Universidade da Califórnia, junto outros pesquisadores de peso, publicado na BMJ – British Medical Journal, um dos periódicos médicos mais conceituados do mundo, no fim de 2022.

O estudo concluiu o óbvio do que acontece em um público fora do grupo de risco, como jovens e crianças saudáveis: precisaria vacinar cerca de entre 30 e 40 mil jovens para prevenir uma única internação por COVID neste público, mas essas vacinações causam 18,5 eventos adversos graves, incluindo miocardite e pericardite, que geram entre 1,5 e 4,6 internações. Ou seja, internaria mais gente por eventos adversos das vacinas do que evitaria internações de COVID.

Enquanto isso, no Brasil a vacinação é obrigatória para todas as crianças, mesmo as perfeitamente saudáveis e não há diálogo.

O fenômeno da cortina de proteção

Uma das coisas que mais me interessa em toda a pandemia é o comportamento das sociedades. Em relação às vacinas, não há diálogo. Não há debate, os fatos e os dados são ignorados.

Eu não consigo lembrar de uma única questão em relação às liberdades individuais que o Brasil está na contramão do mundo, isolado, fazendo diferente do que todos os outros países. Nenhum. 

E o diálogo não adianta. Você fala que o Brasil é o único, entra por um ouvido e sai pelo outro. Falou de vacinas? As pessoas baixam uma cortina de proteção e nenhum argumento será ouvido e avaliado.

Só resta um único pensamento para essas pessoas: “Nós estamos certos e o mundo está errado”. O que seria exatamente o pensamento de um cidadão médio no Iraque ou na Síria durante o Estado Islâmico ao verem gays sendo jogados de prédios. Pode ter variações: “E daí que o mundo faz diferente? Nós somos um país soberano”.

Durante um tempo, eu fui fazendo testes só para ver como as pessoas reagem ao argumento do Brasil estar isolado de todo o mundo. Há alguns meses, eu estava em um bar na minha cidade tomando cerveja e comendo um espetinho. Um amigo de longa data, jovem, com menos de 30 anos, e presidente do PT da cidade, partido de centro-esquerda, do presidente da república Lula da Silva, se aproximou com sua namorada e mais uma jornalista da cidade. Os convidei para sentar.

Depois de algumas conversas, ao me perguntarem como eu achava que estava o desempenho do presidente, afirmei que desaprovava. Expliquei que o Brasil é único país do mundo obrigando vacinas COVID-19 em crianças, enquanto Alemanha, Reino Unido, Suécia e Dinamarca sequer recomendam. “Você é antivacina, né?”, alguém perguntou. “Você está querendo dizer que eu concluir que a Alemanha e Reino Unido estão certos e o Brasil errado é ser antivacina”? Perguntei de volta. Não obtive respostas. Por algum motivo, eles sentem que não precisam refletir ou responder. E no fim das contas, disseram claramente apoiar a obrigatoriedade. É exatamente como ser chamado de “infiel” por membros do Estado Islâmico.

Há poucos dias, eu estava em um restaurante com outro amigo. Ele é advogado e militante em direitos humanos pela Ordem dos Advogados do Brasil. Introduzi o assunto falando de influências culturais. Na sequência, perguntei se ele se lembrava de alguma liberdade individual que apenas o Brasil faz diferente do restante de todo o ocidente. Ele não lembrou. Falei da vacinação infantil de COVID-19, expliquei que o Brasil é o único país obrigando e listei os países que sequer recomendam. Não gerou nenhuma indignação. Eu forcei um comentário:”Quem garante que esses países estão certos?”, perguntou. Certamente, uma pergunta que um cidadão comum simpático ao Estado Islâmico faria em Bagdad.

A um terceiro amigo, muito inteligente, enquanto tomávamos alguns chopes, introduzi o assunto como neste artigo aqui. Comecei explicando o poder da frase: “O Brasil é o único país do mundo fazendo tal coisa”, e segui falando da escravidão, falei sobre união de pessoas do mesmo sexo, e segui até dando exemplos onde os EUA foram os últimos. Citei Rosa Parks, nos EUA, se recusando a ir em um ônibus que separava os lugares de negros e brancos. Realmente, não tinha como os EUA ficarem sozinhos naquela. Expliquei que provavelmente, os que eram contra, na época, diziam: “Só os EUA fazem esse absurdo”.

Sabendo já do padrão de resposta de todos, com este amigo nem forcei para saber se ele se indignava. Eu joguei o problema e pedi ajuda para desvendar o motivo de ninguém se indignar com o fato do Brasil estar sozinho, como o estado Islâmico jogando gays de prédios.

“O raciocínio lógico não vem antes das barreiras morais”, explicou esse amigo. Sem dúvida alguma, o competente marketing das vacinas COVID-19 conseguiu transformar a comercialização do produto farmacêutico injetável em uma questão moral. E a mesma frase explica a execução de gays pelo estado Islâmico.

Recentemente, na televisão, um juiz de direito explicou claramente: se os pais brasileiros não quiserem vacinar seus filhos com as vacinas COVID-19, o estado pode tomar a criança dos pais. Ou seja, se os brasileiros desconfiarem das recomendações das autoridades brasileiras e preferirem as recomendações da Alemanha, Reino Unido, Suécia, Dinamarca e Suíça, eles terão seus filhos sequestrados como penalização.

No meu entender, tomar uma criança dos pais é algo tão brutal quanto jogar gays de prédios.

Antes de finalizar, vamos falar o óbvio: o vírus COVID-19 no Brasil é o mesmo que corre na Europa. As vacinas oferecidas aqui para crianças são exatamente as mesmas que os países europeus poderiam oferecer às suas crianças. E a constituição biológica das crianças brasileiras são exatamente as mesmas das outras do mundo. Não existe um motivo lógico sequer para o cálculo de risco e benefício ser diferente.

Opressão constante

Agora, em junho de 2024, o judiciário de um estado do sul do Brasil, Santa Catarina, ordenou que os pais vacinem duas filhas pequenas contra a COVID-19 em um prazo de 60 dias. O primeiro passo da coerção, antes de sequestrar as crianças, é ameaçar com uma multa entre R$ 100 e R$ 10.000 por dia enquanto as crianças não forem inoculadas. 

“Enquanto cidadãos marcados pela ética, permanecemos com o irrenunciável compromisso para com a saúde e a integridade de cada ser humano, especialmente das crianças e adolescentes, respeitando a ciência em prol da vida”, escreveu o juiz na decisão, acreditando ser um herói defensor da ciência.

Que fique registrado na história: por aqui, não adianta falar “apenas o Brasil faz isso” quando falamos de vacinas COVID-19. A sociedade toda ignora, assim como não adiantava falar, para o estado islâmico, que “apenas vocês fazem isso” sobre matarem homossexuais. Em ambos os casos, a reação é semelhante: nenhuma reflexão.