Uma reportagem publicada pela Revista Fórum com o título “Cidade de SC pode estar com surto pelo uso prolongado de ivermectina“, repercutida em diversos órgãos de imprensa, afirma que a cidade de Balneário Camboriú, em Santa Catarina, está enfrentando um surto de sarna devido ao uso indiscriminado de ivermectina. Segundo a publicação, o uso prolongado do medicamento teria causado resistência nos parasitas responsáveis pela sarna, resultando em uma maior vulnerabilidade da população à doença.

Contudo, essa afirmação não encontra respaldo em evidências científicas recentes. Um estudo intitulado “Falha no tratamento da sarna: uma revisão sistemática e meta-análise“, (Failure of scabies treatment: a systematic review and meta-analysis, em inglês), publicado no periódico British Journal of Dermatology em fevereiro de 2024, contradiz diretamente essa alegação. Esta revisão sistemática, que analisou 147 estudos, concluiu que a resistência à ivermectina pode ser tratada eficazmente com uma segunda dose do medicamento.

Na conclusão, os cientistas envolvidos na pesquisa afirmam: “Uma segunda dose de ivermectina apresentou menor prevalência de falha do que uma dose única de ivermectina, o que deve ser considerado em todas as diretrizes. O aumento na falha do tratamento ao longo do tempo sugere uma diminuição da suscetibilidade dos ácaros a vários medicamentos, mas as razões para a falha raramente são avaliadas”.

“É no mínimo altamente especulativo e criativo imaginar que uma droga que foi usada de forma regular até mais de dois anos atrás iria causar uma suposta resistência, que sequer encontra evidência robusta sobre sua existência. Curioso também que ignoraram os surtos em regiões onde a ivermectina não foi usada de forma sistemática. Pra terminar, como funciona essa história de resistência à ivermectina pela escabiose, se usa-se por décadas com regularidade em grandes partes do mundo? Tem uma frequência máxima de uso? Qual seria?”, questiona o Dr Flavio Cadegiani, pesquisador da COVID-19 com diversos estudos publicados na área.

Revista Fórum reincide em erros, semelhante a confusões anteriores

Em 2021, uma notícia da BBC intitulada “Como mariposas provocaram surto misterioso de coceira em Pernambuco” ilustrou um caso similar de desinformação. Inicialmente, suspeitou-se que o surto de coceira em Pernambuco fosse causado por escabiose (sarna) ou intoxicação por ivermectina, cujo consumo aumentou durante a pandemia de covid-19. Contudo, após investigação da Sociedade Brasileira de Dermatologia, descobriu-se que a causa real eram fragmentos de mariposas que irritavam a pele, e não o uso de ivermectina.

Comentário do MPV

O MPV – Médicos pela Vida, expressa profunda preocupação com a disseminação de informações não corroboradas por evidências científicas sólidas. A alegação de que o uso prolongado de ivermectina está causando um surto de sarna em Balneário Camboriú é infundada e alarmista. Publicações desse tipo podem gerar desinformação e pânico entre a população.

O suposto estudo que suporta as notícias sensacionalistas é um nível extremamente baixo de evidência quando comparado com Meta-análise com Revisão Sistemática, o mais alto nível de evidência científica, ainda mais envolvendo 147 estudos, um número alto. Além disso, a pesquisa não é nem indexada na Pubmed, o que evidencia uma rigorosidade abaixo dos mínimos exigidos pela comunidade científica internacional.

É também importante ressaltar que tais narrativas podem, intencionalmente ou não, favorecer os interesses das grandes indústrias farmacêuticas, que muitas vezes lucram com a venda de novos medicamentos ao criar desconfiança em tratamentos acessíveis e eficazes como a ivermectina. Reiteramos a importância de consultar fontes confiáveis e baseadas em evidências científicas antes de divulgar informações relacionadas à saúde pública, evitando assim a propagação de mitos e o favorecimento de interesses comerciais. E na dúvida, consulte sempre seu médico de confiança.

Fonte

Failure of scabies treatment: a systematic review and meta-analysis | British Journal of Dermatology | Oxford Academic

Leia mais

COVID-19: estudo ‘padrão ouro’ comprova eficácia da ivermectina