Desde o início da pandemia da COVID-19, as comunidades médica e científica têm buscado opções de drogas e vacinas para o tratamento e controle da doença. Pesquisas têm sido desenvolvidas com o intuito de descobrir novos medicamentos e também para avaliar a eficácia de drogas já disponíveis no mercado que possam também ser usadas de forma segura contra a COVID-19.

Uma revisão sistemática e meta-análise bayesiana de dados publicada no prestigiado periódico JAMA Network Open por pesquisadores dos Estados Unidos e Canadá, incluindo três estudos clínicos com 2196 pacientes analisados, mostrou que existe uma alta probabilidade (94,1% a 98.6%) de que a droga fluvoxamina, um medicamento barato, genérico e sem patentes, esteja associada a uma moderada redução do risco hospitalização de pacientes com COVID-19 tratados em ambulatório. Os três estudos analisados pelos autores antecederam às variantes Delta e Ômicron do vírus SARS-CoV-2, e consistem em ensaios randomizados controlados por placebo, sendo dois deles de duplo-cego. Os pacientes recrutados eram adultos, sintomáticos não vacinados com infecção por SARS-CoV-2 confirmada microbiologicamente, que estavam dentro do intervalo de 6 a 7 dias após a infecção e não necessitavam de oxigênio. Dentre os estudos, a idade média dos pacientes estava na faixa de 42 a 50 anos, de 55% a 72% deles eram mulheres, e de 44 a 56% eram obesos.

Os resultados dos três estudos selecionados para a revisão já eram individualmente bastante interessantes. Seftel e colaboradores chegaram a uma redução de 94% no risco de hospitalização e de 84% no risco de morte em um estudo que envolveu 125 pacientes (dos quais, 77 foram tratados com fluvoxamina). No estudo randomizado duplo-cego de Lenze e colaboradores com 152 pacientes (sendo 80 tratados com fluvoxamina), foi observada uma redução de 82% no risco de hospitalização. E no duplo-cego randomizado com 1497 pacientes (741 tratados com fluvoxamina), Reis e colaboradores mostraram uma redução de 22% no risco de hospitalização e de 91% no risco de morte.

Esta revisão e metanálise sobre a fluvoxamina se destaca por apresentar características de um estudo bastante robusto dando confiabilidade aos resultados: uso de todos os dados disponíveis; consistência dos resultados verificada por duas abordagens distintas: bayesiana com estimativas de probabilidade anteriores e metanálise clássica de efeitos aleatórios; e a probabilidade de qualquer associação e associação moderada da fluvoxamina com a redução da hospitalização foi quantificada em todas as análises com o intuito de ajudar na tomada de decisão.

Os autores do estudo mencionam que apesar das evidências científicas disponíveis até o momento, a Sociedade de Doenças Infecciosas da América é contra o uso da fluvoxamina, com exceção para estudos clínicos. Mas eles argumentam que, tendo como base sua análise, somado ao fato de que a fluvoxamina é acessível mundialmente e reconhecidamente segura há décadas, seu uso parece ser uma opção razoável para pacientes de alto risco que não tenham acesso a outros tratamentos para a COVID-19.

800 pacientes com zero progressões para a UTI

“Desde o primeiro estudo randomizado de pequeno número, que foi publicado em 2021, que eu já vinha adotando fluvoxamina, a princípio, para casos que eu considerava de maior risco. E depois dos estudos que foram publicados neste ano, antes mesmo da metanálise de abril, eu passei a adotar a fluvoxamina como praticamente rotina no meu consultório. E o que eu posso dizer é que a resposta à fluvoxamina, quando iniciado precocemente, principalmente até o quinto ou sexto dia é excepcional, nenhum paciente foi para a UTI dos que tomaram a fluvoxamina”, afirmou o médico Francisco Cardoso, que tratou 800 pacientes com o medicamento.

“Alguns pacientes tiveram intolerância ao remédio, apesar de ele demorar para fazer o efeito psiquiátrico, e eu tive que tirar. Mas é uma droga que deveria ser primeira linha do tratamento da COVID, principalmente em locais em que a gente não tem anticorpo monoclonal. Ou seja, praticamente o mundo inteiro, exceto algumas ilhas de excelência fora dos Estados Unidos e o próprio território americano. Eu não entendo porque as sociedades de infectologia não recomendam. É indesculpável, inaceitável, imperdoável que até agora as sociedades de infectologia se omitam em relação a não incluir a fluvoxamina em seus guidelines, enquanto mantém indicações esdrúxulas como de tamiflu, e como inclusive plasma convalescente, terapia proscrita. Pelo menos quatro grandes ensaios clínicos randomizados que mostraram que é uma intervenção que agrava e piora a saúde do paciente, e que pode induzir inclusive mutação”, complementou Cardoso.

Sem riscos de vício

O medicamento é utilizado na psiquiatria, o que gerou dúvidas e temores de alguns médicos. “Não existe risco de viciar porque a gente limita a dez dias o uso, é insuficiente inclusive para dar o efeito psiquiátrico, muito menos o de causar vício. Isso é uma fala detratora daqueles que a gente sabe que são da torcida da morte, de quem não gosta de ver nenhum remédio reposicionado, mas vibra com o primeiro preprint da indústria farmacêutica”, explicou Cardoso.

Imprensa não se pronunciou

Este estudo foi publicado no dia 6 de abril. A grande imprensa não publicou matérias noticiando os bons resultados. A fluvoxamina é um medicamento barato, genérico e sem patentes. A grande mídia publicou sobre o Paxlovid, um medicamento da Pfizer, patenteado, que custa cerca de R$ 2.500 por paciente – e que possui um nível menor de evidências científicas que a Fluvoxamina. Para festejarem o Paxlovid, não pouparam palavras elogiosas: “marco histórico na  medicina”, disse um dos depoentes na matéria no UOL. Entretanto, o Paxlovid não está indo bem. A alardeada eficácia de 90%, sem nenhuma surpresa para medicamentos patenteados, já baixou para 70%. E a doença tem voltado em um grande número de pacientes medicados. Mas para saber sobre “rebote”, é necessário ir na mídia do exterior, como na revista Time, dos EUA: “Here’s What Scientists Know About Paxlovid Rebound”.

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