Enquanto o governo federal procura instituir a obrigatoriedade das vacinas COVID-19 para crianças, o Ministério da Saúde lançou uma seção intitulada “Saúde com Ciência” em seu site. O objetivo declarado é louvável: combater a desinformação, ou seja, lidar com notícias deliberadamente falsas ou informações incorretas.
No entanto, em sua campanha contra notícias falsas, o Ministério da Saúde omitiu informações primordiais para esclarecer a população.
Neste contexto, realizaremos uma análise de maneira didática, fornecendo links para todas as fontes, explicando como o Ministério da Saúde contribuiu para a disseminação de desinformação.
Conceito científico base
O conceito científico fundamental a ser considerado no contexto da vacinação COVID-19 em crianças é a variação na manifestação do vírus em diferentes faixas etárias. É amplamente reconhecido que o COVID-19 se manifesta de maneira distinta em crianças e idosos, sendo que este último grupo enfrenta um risco significativamente maior de complicações. Dessa forma, a avaliação de risco e benefício varia conforme a faixa etária.
Uma analogia pode esclarecer essa abordagem. Em muitas regiões do Brasil, devido ao clima tropical, a febre amarela é uma preocupação. No entanto, a vacina contra a febre amarela não é administrada a todos os brasileiros indiscriminadamente. Ela é reservada para aqueles que enfrentam um risco real da doença. Portanto, não seria lógico expor a vacina a pessoas que não correm o risco de contrair a doença, como aquelas que trabalham na Avenida Paulista, em São Paulo. Essas pessoas só precisam receber esta vacina se planejam viajar para áreas endêmicas, como a Amazônia.
O que sabemos e o Ministério da Saúde também sabe
Nós, do MPV – Médicos Pela Vida, sabemos que ao compararmos as decisões de outros países com as do Brasil sobre vacinação de jovens e crianças, a informação torna-se facilmente compreensível e averiguável, sem dificuldades, para a grande maioria da população em geral. Além disso, há o prestígio desses países, tornando essas decisões de suas respectivas autoridades governamentais como fatos relevantes para suas decisões pessoais.
Diante disso, aqui, em nosso website, noticiamos orientações de vacinação de diversos países. Em fevereiro de 2022, por exemplo, noticiamos que a Dinamarca, já na época, deixou de recomendar a vacina COVID-19 para qualquer pessoa saudável com menos de 50 anos de idade. No mesmo período, em janeiro de 2022, noticiamos que a Inglaterra não recomendava a vacinação COVID-19 para crianças saudáveis entre 5 e 11 anos. De lá para cá, essas idades foram subindo.
Além de noticiar esses fatos, o MPV aprofundou sua análise sobre a vacinação COVID-19 em crianças e jovens, inclusive traduzindo trechos de um estudo da equipe de Vinay Prasad, da Universidade da Califórnia, publicado no periódico BMJ – British Medical Journal. Nosso título foi: “Passaporte vacinal para estudantes é antiético, diz BMJ“.
Em resumo, este estudo da Universidade da Califórnia, de dezembro de 2022, concluiu que, em jovens saudáveis, o risco da vacinação supera, e muito, os benefícios. “Os formuladores de políticas devem revogar imediatamente a obrigatoriedade de vacina COVID-19 para jovens adultos e garantir caminhos para compensação àqueles que sofreram consequências negativas dessas políticas”, escreveram os autores.
Contudo, o MPV reconhece a necessidade de contextualizar informações científicas, considerando que a publicação na BMJ ou a referência a Vinay Prasad podem ser compreendidas e valorizadas plenamente apenas por pessoas familiarizadas com o campo médico. Portanto, a abordagem do MPV inclui destacar as decisões de países, como Dinamarca e Inglaterra, que se basearam nesses estudos para suas decisões, tornando a informação acessível a uma audiência mais ampla, desde pais ou responsáveis tomando decisões de vacinar crianças, até formuladores de políticas públicas.
O Ministério da Saúde também sabe que as decisões de outros países, para comparação, possuem peso.
O que fez o Ministério da Saúde?
Por saberem que o prestígio das decisões de outros países é fundamental na comunicação, na capa da seção “Saúde com Ciência”, o Ministério da Saúde manteve, desde o dia do lançamento, a seguinte matéria: “É verdade que outros países já suspenderam a vacina contra a Covid-19, menos o Brasil?“.
Ao abrir a matéria de título dúbio (afinal, “menos o Brasil” visaria responder se, entre os quase 200 países existentes no mundo todo, o Brasil seria a única exceção de não suspender totalmente as vacinas COVID-19 de modo geral, o que não seria verdade), há diversas informações, mas não há o principal: referências sobre como países evoluídos estão lidando com a pandemia.
Ou seja, em vez de falarem de países prestigiados, afinal, é isso que eles se propuseram a responder, a matéria inicia perguntando e respondendo questionamentos genéricos: “É verdade que a pandemia acabou?”, ou “Isso significa que o Brasil e outros países já superaram a Covid-19?”. De qualquer modo, dessas duas perguntas introdutórias que fizeram, eles responderam corretamente: a pandemia não foi superada.
Afinal, outros países já suspenderam a vacina?
Esta é a pergunta original que o Ministério da Saúde se propôs a responder e, no fim das contas, não citou nenhum país específico, principalmente os já noticiados por nós, aqui no MPV, em matérias que viralizaram a partir de nosso website.
Já que não responderam, vamos conferir juntos, agora, em novembro de 2023, como estão as recomendações de alguns países desenvolvidos?
Dinamarca
É um país na Europa com 5,857 milhões de habitantes. É reconhecido por ter um excelente sistema de saúde e profundo respeito com sua população. No Índice de Percepção da Corrupção, organizado pela Transparência Internacional, está como o país menos corrupto do mundo, enquanto o Brasil está ranqueado no número 94.
Na Dinamarca, quem possui recomendação?
Para vacinas COVID ou de gripe, as autoridades explicam: “O risco de ficar gravemente doente devido à gripe e à COVID-19 aumenta com a idade. Portanto, todas as pessoas com 65 anos ou mais recebem vacinas contra ambas as doenças”, afirma o site do Ministério da Saúde da Dinamarca.
Há exceções para menores de 65 anos?
Sim, há exceções para a vacinação em menores de 65 anos. Essas exceções abrangem pessoas que enfrentam condições específicas de saúde, tais como doença pulmonar crônica, diabetes tipo 1 e 2, imunodeficiência congênita ou adquirida, doença hepática ou renal crônica, obesidade, entre outras situações.
Crianças saudáveis possuem recomendação?
Não.
Fonte: Danish Health Authority – 1 October 2023 – 15 January 2024 (arquivo)
Reino Unido
Fica na Europa, é constituído por quatro países: Escócia, Inglaterra, Irlanda do Norte e País de Gales. Possui 65 milhões de habitantes. O SUS (Sistema Único de Saúde) do Brasil foi inspirado no NHS (National Health Service). No Índice de Percepção da Corrupção, organizado pela Transparência Internacional, é o décimo oitavo país menos corrupto do mundo.
No Reino Unido, quem possui recomendação?
Para vacinas COVID é necessário ter 65 anos ou mais.
Há exceções para menores de 65 anos?
Se forem pessoas que correm maior risco, se moram em uma casa de repouso para idosos, se são profissionais da saúde ou assistência social de linha de frente, se são cuidadores de idosos ou se possuem entre 12 e 64 anos e moram com alguém com sistema imunológico enfraquecido. Além disso, para pessoas que possuem doenças específicas, como doença cardíaca de longo prazo, epilepsia, autismo, paralisia cerebral, esclerose múltipla ou doença do sistema nervoso ou dos músculos, entre outras condições.
Crianças saudáveis possuem recomendação?
Não.
Fonte: NHS: Getting a COVID-19 vaccine (arquivo)
Suíça
Fica na Europa e possui 8,5 milhões de habitantes. Segundo a transparência internacional, é o sétimo país menos corrupto do mundo.
Na Suíça, quem possui recomendação?
Pessoas com 65 anos ou mais.
Há exceções para menores de 65 anos?
Sim. Apenas pessoas com comorbidades, como doenças crônicas específicas, cardiológicas, diabetes, deficiências imunológicas, entre outras.
Crianças saudáveis possuem recomendação?
Não.
Fonte: Federal Office of Public Health FOPH (arquivo)
Comentário MPV
O Ministério da Saúde não respondeu adequadamente a própria pergunta, omitindo assim informações cruciais. Ou seja, produziu desinformação. Entre os países evoluídos não há recomendação de vacinas para crianças saudáveis, principalmente as pequenas, como deseja-se na obrigatoriedade no Brasil planejada para 2024. Portanto, sim, outros países suspenderam as vacinas para populações que não fazem parte do grupo de risco, ou sequer algum dia indicaram.
O ministro da saúde da Dinamarca, Soren Brostrom, chegou a pedir desculpas para a população por, no começo, ter recomendado vacinas COVID-19 para menores de 16 anos: “As vacinas não foram predominantemente recomendadas para o bem da criança, mas para garantir o controle da pandemia”, afirmou.
O MPV não tem condições de fazer o levantamento de todos os países com objetivo de produzir uma tabela comparativa, mas de todos que pesquisamos, nenhum obriga vacinas COVID-19 em crianças pequenas. A tendência mundial é aumentar as idades, não o contrário. Além desses países acima já listados, a Alemanha, por exemplo, não recomenda, muito menos obriga, vacinas para crianças saudáveis. A Suécia também não. São países sérios, com sistemas de saúde sólidos e avançados.
O Ministério da Saúde do Brasil, no meio de uma campanha que deseja vacinar crianças, não precisaria tratar toda a população de modo infantil. Deveria informar os fatos e deixar que cada um decida por si. Não custa lembrar que o consentimento informado é o único caminho ético possível.
Além disso, recentemente, no Congresso Federal, o Dr Eder Gatti, médico infectologista e Diretor do Programa Nacional de Imunizações (PNI – Ministério da Saúde), disse que, em 2023, mais de 4.600 crianças menores de 5 anos foram hospitalizadas por Covid-19 e 115 infelizmente faleceram, mas ele não apresentou quantas dessas crianças tinham doença grave concomitante, se morreram por causa da COVID-19, por causa de outra doença e estavam apenas com RT-PCR positivo, que poderiam ser um assintomáticos de COVID-19 ou falsos positivos. Também não apresentou o status vacinal delas. O Ministério da Saúde precisa ser transparente e é necessário fazer uma análise dessas informações, não simplesmente jogar esses números sem detalhes e usá-los para impor vacinação obrigatória sem qualquer respaldo ou critério específico.
E devido a essas estatísticas parciais, o Ministério da Saúde chegou a conclusão que obrigar milhões crianças saudáveis a se vacinarem irá reduzir esse número. Nós, do MPV, sinceramente, não entendemos esse raciocínio: existe alguma evidência científica para essa decisão na contramão da Alemanha, Suécia, Reino Unido, Suíça, Dinamarca, entre outros? Não há qualquer fundamento científico que justifique a obrigatoriedade.
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